terça-feira, 26 de junho de 2012

A minha breve história da Cervejaria Corsário



Eu tive uma breve experiência trabalhando no mercado cervejeiro. Fui gerente da Cervejaria Corsário, um proto-brewpub que funcionou por apenas 45 dias em São Paulo, entre julho e agosto de 2011. A casa era uma parceria entre a cozinheira Eliane André (Casa da Li) e os cervejeiros Marcelo Cury e Marcelo Games. Na verdade a Corsário ocupava, durante a noite, o mesmo espaço onde funciona o restaurante-rotisseria da Eliane.

O projeto era muito legal e eu estava entusiasmado por trabalhar em um novo ramo, depois de vários anos sentado dentro de um escritório. Comecei a trabalhar lá uma semana antes da inauguração e logo nos primeiros dias ficou claro que a relação entre os sócios não era das melhores. De um lado a cozinheira cobrava uma postura profissional de todos e tentava impor seu paradigma de bar tradicional, no estilo Astor.  Do outro lado os cervejeiros tinham uma postura pouco compromissada com o dia a dia da casa, pareciam mais preocupados em receber bem seus convidados. Pelo menos os Marcelos tinham uma ideia menos careta de bar, com a proposta de um serviço mais descontraído.

O maior conflito entre os sócios era devido a oferta (ou falta de) cervejas da casa. Veja bem: na Cervejaria Corsário a produção era artesanal MESMO, na panela. Os Marcelos cervejeiros até tinham o sonho de adquirir equipamentos industriais, mas a intenção inicial era vender a mesma cerveja que eles costumavam fazer em casa. O ritmo de produção também era o mesmo de quando a cerveja era apenas para consumo próprio, durante os 45 dias de funcionamento da Corsário eles só brassaram uma vez. Não preciso nem dizer que raramente tínhamos alguma cerveja da casa para servir e o pouco que tinha era muitas vezes reservado para o dia em que os amigos visitavam. Para cobrir a ausência de cervejas Corsário havia uma ótima carta de cervejas, inclusive alguns chopes exclusivos na cidade.

Apesar de tudo, o movimento não era tão ruim para um bar recém inaugurado. Os donos eram muito bem relacionados e a divulgação foi muito boa, figurou nos principais guias semanais da cidade. Mas do jeito como estávamos trabalhando seria muito difícil que desse lucro. Não havia um único garçom contratado e o custo de contratar garçons eventuais era bem alto. Os únicos funcionários contratados para trabalhar na Cervejaria Corsário eram eu (gerente) e o Cícero, um  tirador de chope veterano de larga experiência com chopp Brahma. Na cozinha, a equipe do restaurante "Casa da Li" garantia os comes.

Fui contratado pelos Marcelos Cury e Games para trabalhar na Cervejaria Corsário. A princípio, eles deixaram bem claro que, apesar de dividirem o mesmo espaço da "Casa da Li" e terem a Eliane como sócia, eu seria funcionário apenas da cervejaria. A Eliane discordava disso e eu, tentando agradar a todos, me dispus a trabalhar em alguns almoços de domingo do restaurante. A Eliane, ao contrário dos cervejeiros estava sempre presente, porém era uma pessoa muito difícil de lidar, encrenqueira e egocêntrica. Conhecendo a figura dá para entender porque havia tanta dificuldade em contratar garçons. Nas semanas que estive trabalhando com ela vi ao menos um funcionário por semana pedir as contas.

Em pouco tempo o relacionamento entre os sócios degringolou para acusações de desonestidade e afins. A dedicação errática que os cervejeiros demonstraram durante o funcionamento do bar se transformou em desapego, pois pouco se dedicaram a contornar a situação para manter a cervejaria aberta. A Cervejaria Corsário fechou com a promessa (não cumprida) de reabrir rapidamente em outro endereço. Eu que, no entusiasmo de trabalhar em um brewpub, aceitei ficar na informalidade nos primeiros meses, me dei mal. Se no começo os sócios disputavam para saber a quem o gerente estava subordinado, quando fechou nenhuma das partes assumiu a dívida comigo referente aos últimos 15 dias trabalhados, muito menos pelo pagamento dos 10% da taxa de serviço, que foi cobrado e nunca repassado. O pouco comprometimento que eles demonstraram com o próprio negócio se estendeu a mim. Fui demitido por email e fiquei sem receber.

Dessa experiência na Cervejaria Corsário tem um fato em especial que preciso contar aqui, pois está diretamente relacionado a criação desse blog.  Quando comecei a trabalhar lá, os proprietários da Corsário não sabiam que eu havia sido pivô da polêmica com a validade das cervejas americanas. Durante a festa de inauguração da Cervejaria Corsário, alguém próximo àquela importadora me reconheceu e prontamente avisou o dono da importadora, que na mesma noite ligou para o Marcelo Cury pedindo a minha cabeça. Naquela madrugada, depois da festa, fui longamente interrogado pelos donos da Corsário, pois haviam recebido uma denúncia (bizarra) de que eu já havia trabalhado antes no ramo e teria tido uma motivação "profissional" naquela famigerada polêmica. Felizmente (ou não) tudo ficou esclarecido naquela noite e eu continuei trabalhando na Cervejaria Corsário por mais um mês, até o encerramento das atividades.

3 comentários:

  1. A cerveja deles era boa mesmo... Quando tinha para vender, claro! :-/
    A comida também era show, estavam no coração da Vila Madalena e... Bem, realmente é incrível o que as pessoas fazem para um negócio não dar certo. Dá para ver que o esforço nesse sentido foi pesado e acabou dando resultado. Pelo menos, se foi essa uma das motivações para a criação desse blog, não saímos com tanto prejuízo. É sempre bom ter uma alternativa à entediante mesmice virtual...

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  2. Uma pena mesmo o final precoce da Corsário. A proposta (ideia) era muito boa, me parecendo até superior ao conceito da Cervejaria Nacional. Contudo e com o passar dos dias, uns (CN) revelaram-se profissionais, mostrando que estavam preparados para o negócio e outros (Corsário), amadores. Ainda torço por sua reabertura, mas creio que isso já se tornou utópico, certo?

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  3. Conheço ambos os Marcelos...
    Quando saírem da adolecencia, serão grandes profissionais.

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